quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Inteligência Artificial

Esses dias estava conversando com uns amigos sobre a questão de ser inteligente. Comentávamos de estudantes da USP dentre outros (os amigos que comentavam comigo estudam lá) que vivem levantando bandeirinhas.

Muitos destes, desculpem-me a agressividade, são um bando de filhinhos de papai que defendem causas, pegam seus carrinhos e voltam para a casa.
Desde quando pobre pega carrinho para voltar para casa? Pega ônibus, lotação, metrô, trem. E se tiver carro, com certeza não foi porque o papai deu, foi por ter lutado muito na vida, e conseguir não um carro, mas uma caranga.

Desculpem-me mas lutar por causas sociais e voltar para casa de carro (transporte coletivo é opção), encontrar comidinha feita, roupinha limpa e caminha arrumada é “surreal”, povo!
Daí vem aquela historia de inteligência e cultura: “Ui, eles são inteligentes, são cultos!”.
São? Se eu estudasse a vida inteira nos melhores colégios particulares, ainda tivesse a cara de pau de fazer cursinho nos melhores lugares, também por obrigação eu teria que ser supostamente inteligente. Portanto o que temos são computadores humanos com a memória cheia de informação.

Isso para mim não é ser inteligente, isso é apenas um computador com memória cheia.

Construíram discretamente uma modinha, melhor que as outras, pois tem assunto, sabem discutir, mas longe de serem inteligentes. Inteligência hoje é você sacar que o preconceito não acabou, que o que surgiu foi o capitalismo em cima dele. Que a natureza não terá fim pois é mutante mas que o capitalismo encontrou meio de lucrar com a Ecologia. Que o governo não é a favor da homossexualidade, mas do dinheiro que ela gera. Que no Brasil você não precisa “votar com consciência” pois isso não existe aqui. O Brasil é pobre, foi pobre e continuará pobre até o dia em que descobrirem como lucrar com a transformação da pobreza em riqueza. Daí fica uma boa porcentagem lendo nomes, assistindo nomes e acreditando que realmente são muita coisa.
Somos malvistos, esta é a verdade. Somos bunda, sexo e futebol. Lembrei-me de um vídeo no Youtube, onde Marília Gabriela entrevistava Madonna: a super star simplesmente desprezou a entrevistadora. E esta foi infeliz, pois fez perguntas absurdas, tentou ser tão perfeita que perguntas simples certamente seriam mais bem-vindas.

Conheço poucos casos de inteligência e mesmo assim, um deles esqueceu de se reciclar, de olhar para a Cultura Industrial em que vivemos e perdeu parte de sua sabedoria. Perdeu não, estacionou. Inteligente é o cara pobre, homossexual que saiu de um lugar simples, se formou numa universidade simples, leu nomes não para se aparecer, mas para conhecer, enfrentou preconceitos, se fez “gente”, aprendeu línguas sozinho, é muito mais sábio do que fulaninhos pós-graduados, doutorados e todos os ados possíveis.

Inteligente é o garoto pobre que cuidou dos irmãos, que o pai suou para pagar a faculdade , que se permitiu mudar, aprender, reciclar, que entrou na USP quase dez anos depois da primeira entrada na faculdade. Que não ficou rico, mas que te deixa no “ chinelo” em relação a qualquer assunto.

Inteligente é a menina que quase teve uma chance de ter uma boa vida na infância, mas que a própria vida levou para o orfanato, para a favela e quase que para a rua aos 17 anos de idade e mesmo assim Fo trabalhar ao invés de se estragar; lutar para não morrer de fome, estudou e aprendeu fora de cursos de renome; cursou uma faculdade por ter auxílio da tia, pois não conseguiria se manter sozinha com uma faculdade para pagar.

Uma pessoa que fuça, que reflete, que se não conhece o assunto vai conhecer e pensa além do que a sociedade ousa imaginar.

Inteligência é isso. Ela vem de dentro independente de se ter estudado nos melhores colégios ou de se ter pós, após, depois, além.

Muita gente confunde inteligência com esperteza. Esperto e mau caráter a fabrica de seres humanos produz aos montes. Agora, produção de Inteligência é artesanal: a vida escolhe os ingredientes com cuidado, une-os, molda-os. Erra, acerta, muda, até chegar ao toque final e estar pronto para, infelizmente, competir com produtos fabricados no mercado, em massa, jogados aos montes nas prateleiras.

Bitolados em Mandamentos

Nesses últimos dias estive pensando sobre o fascínio e o domínio que um livro pode exercer sobre nós.

Há pouco tempo vi o livro “O Segredo” se tornar febre; até critiquei quem mergulhou de cabeça. Meses depois li um livro que me fez olhar de outra forma para a cultura, cujo nome é “O que é Indústria Cultural” – Teixeira Coelho.

Em determinada parte o livro aborda a alienação dentro da própria cultura e mostra a rejeição da cultura tradicional dentro da atual.

Assim penso: também nós, famintos pela notícia, conhecimento, sabedoria, não estamos alienados tanto quanto a sociedade que criticamos? Por exemplo, o “povão” que quer saber de futebol mas não se preocupa com seus bilhões levados pelo governo.

O livro aborda o fato de ingerirmos toda a cultura que nos é passada sem criticarmos, seja qual for o caminho. Um exemplo: recebemos a notícia de que um avião caiu; muitos, famintos por informação digerem a notícia, comentam, mas esquecem de acrescentar na sopa toda uma singela questão: a pergunta “Será?”... Será mesmo que foi assim?

O livro fala sobre ingerir informação, mas não digerir. Esquecemos que a imprensa em si também dança de acordo com a música.

Outro exemplo me chamou a atenção: muitos de nós criticamos a cultura atual (sou uma dessas pessoas): criticamos o cantor que juntou vários instrumentos – sejam eles “musicais” desde a guitarra à tampa de panela e fez um som, cuja letra mistura o samba com o rock; o pintor que pegou um papelão, colocou num pedaço de madeira pintou o fundo com diferentes tipos de tinta e criou um quadro. Ou o escultor que pegou um banquinho de bar, passou nele uma corda, pendurou-o a um ventilador e o mostrou como sua escultura.
Olhamos para tudo isso e perguntamos: “Isso é cultura? Aonde vamos parar?Estamos perdidos?

Sim! Isto é cultura sim! É nossa cultura, são nossos artistas se expressando.
E essas obras não são iguais ao que acontece no mundo hoje? Não somos globalizados? Não somos um mix?

Se hoje aqui do Brasil posso conversar com um amigo que está na Inglaterra e ao mesmo tempo, uma amiga está nos EUA (um mix de conversas, uma mistura de uma cultura de lá, outra de cá...) por que a música daquele cantor tem que ser somente samba? Ou aquele pintor tem de pintar somente imagens que nos passam o que realmente são: casa, gente, praia, e o mesmo segue com o escultor?

O mesmo livro citou o caso de um pintor que retratou em seu quadro, seu momento. Foi considerado arte pois fazia parte de séculos passados. Portanto, o pintor que retratou o século presente foi criticado por pintar a sua realidade. Percebi quanto preconceituosa e alienada sou- e somos.

Admirar a cultura do passado é bom, é natural. Creio que um bom intelectual encara sua realidade, informa-se do seu passado, levanta questões sobre o que aconteceu e acontece e respeita tanto o que já foi quanto o que é, preparando-se para o que será.
Ao criticarmos de forma negativa esquecemos que somos partes vivas desta cultura, querendo ou não.

Não saímos nas ruas vestidos de rendas, chapéus, perucas – por que não criticamos o terno e o jeans?

Um fato despertou-me tempos atrás: fui a uma ópera; foi bonita e blá, blá... tempos depois, pensei: “eu gosto mesmo de ópera? Ou vou porque é culto, é bonito ir?” ... descobri que eu preferia mil vezes o show da Vanessa da Mata, mas descobri de uma forma estranha: como se eu fosse uma católica fervorosa ( falo assim porque minha mãe me obrigou a ser católica no passado- mas não era fervorosa) cometendo um pecado que não me prejudicava.

Não posso dizer que não gosto de ópera, mas descobri que prefiro MPB. Não preciso gostar mais de música clássica para julgar-me inteligente, culta ou informada. Tanto eu ou um amante da música clássica fazemos parte, hoje, da indústria cultural, não há saída.

Por este fato fascinei-me tanto pelo livro. Infelizmente sou ainda uma indústria cultural alienada, pois “quanto mais sei, menos sei” e amante da cultura do passado. Não preciso gostar de tudo o que me mostram, mas posso pensar sobre o assunto, dependendo do que disser meu sentimento e não do que a massa e a elite considerarem bom ou mau.